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Religiosos fazem ato pró-democracia em São Paulo

Grupos temem que avanço do golpe represente ataques ao Estado Laico

Grupos de diversas correntes religiosas promoverão um ato em defesa da democracia nesta sexta-feira (15). O evento ocorre nesta sexta-feira (15) às 19h na Praça do Patriarca, centro de São Paulo.

O manifesto da articulação de religiosas e religiosos - que congrega igrejas cristãs, o povo de santo, espíritas e judeus – se afirma que “o combate à corrupção não pode ser um pretexto, como em diversas vezes na história do Brasil,para legitimar golpes de Estado que acarretaram perseguições e sofrimento para o povo. Vemos também a realidade brasileira ligada às tentativas de desestabilizar os governos da Bolívia, Venezuela, Equador e outros do continente”.

“A democracia é essencial para a convivência e a coexistência entre diferentes religiões, grupos e pessoas não religiosos. Por isso, permaneceremos vigilantes”, afirma o documento.

“Somos pessoas de diferentes comunidades e espiritualidades. A gente sabe o quanto é caro e importante viver em uma democracia. Nós queremos convocar pessoas de bom senso, que acreditam em justiça e paz, para não cometermos um equívoco histórico que já foi cometido quando ocorreu o Golpe de 64”, explica Franklin Felix, facilitador regional da Rede Ecumênica de Juventude (Reju).

Para Felix, há uma grande ofensiva conservadora que ameaça a liberdade religiosa no país. “Para nós religiosos, [o golpe em curso] é nocivo. [Atualmente] já é perigoso para as religiões de matriz africana. Com a ruptura da democracia, nós temos certeza que também haverá ruptura do Estado laico. Há um grande movimento da chamada bancada da Bíblia, que não nos representa. A ruptura da democracia fortalece os setores fundamentalistas, homofóbicos, transfóbicos, racistas e machistas. Esse pessoal não fala em nosso nome”.

Além da Reju, participam da articulação entidades e comunidades como as Católicas Pelo Direito de Decidir, a Igreja Povo de Deus em Movimento, o Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, o Movimento Espírita e Direitos Humanos, a Rede Ecumênica da Juventude, a Koinonia, o povo de santo e parte da comunidade judaica.

No local onde o ato ocorrerá, já se encontram acampados militantes de movimentos populares que protestam contra o golpe.

 

Leia abaixo o Manifesto das Religiosas e Religiosos pela Democracia

 

“Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade”.

Artigo 1º da Declaração Universal de Direitos Humanos.

 

Pertencemos a várias tradições religiosas. Queremos, com o nosso testemunho, contribuir para o diálogo e para a superação da crise pela qual passam o Brasil e diversos países da América Latina. Em nossas tradições a justiça é sagrada e sustenta a vida em igualdade. Os princípios que nos orientam não admitem que a avaliação de um grupo social se sobreponha ao outro, determinando, a partir de seus critérios e interesses, se um governo é bom ou ruim. Todos somos filhas e filhos do Criador. Por isso, todas as pessoas são portadoras dos mesmos direitos de avaliação e as mesmas obrigações com o bem comum e o bem viver.

Neste contexto de aflições, expressamos uma palavra de conforto e fortalecimento para irmãs e irmãos, companheiras e companheiros que vivem o seu testemunho em coerência com o projeto de igualdade e justiça. Colocamo-nos em comunhão com todas as pessoas perseguidas por causa do seu compromisso pela paz, pela justiça social e por um novo mundo possível. Por isso, afirmamos:

- Aprendemos pela fé que toda crise acarreta sofrimento, mas pode também ser como dores de parto, portadora de uma vida nova. Que essa experiência de dor nos ajude a rever os erros cometidos pelas instituições e poderes constituídos e por nós mesmos. Como pessoas de diferentes tradições religiosas, nem sempre cumprimos a missão de permanecer vigilantes para cuidar do exercício da Política e de seu papel de garantir direitos e promover o bem comum.

Que esse tempo nos encoraje para as autocríticas necessárias. Não nos deixemos tomar pelo desânimo e pessimismo. Repudiamos as manifestações de ódio, violência e intolerância que os meios de comunicação e a elite desse país têm insuflado na população. Não concordamos com a judicialização da política, com a partidarização da justiça e com a espetacularização de ações judiciais. Essas são práticas que contribuem para o descrédito das instituições e o acirramento de posições polarizadas, o que leva a população brasileira a desacreditar na justiça. Não podemos entrar no mesmo jogo. Optamos por manter o respeito a quem pensa diferente. Defendemos o direito ao pluralismo democrático e ao contraditório. Sejamos fiéis ao diálogo sincero, mesmo com quem tem posições políticas contrárias às nossas.

- Lembramos que a corrupção, infelizmente, é antiga. Ela é inerente ao espírito do capitalismo, competitivo e individualista. Devemos nos empenhar para a superação dessa prática, nas esferas pública, empresarial e pessoal. Mas o combate à corrupção não pode ser um pretexto, como em diversas vezes na história do Brasil, para legitimar golpes de Estado que acarretaram perseguições sofrimento para o povo.

- Reconhecemos que, além das causas oriundas de situações que são da realidade nacional, há sinais claros de interferências e patrocínios, oriundos de interesses internacionais. Esses interesses visam desestabilizar nossos países, quando nossas nações buscam independência política e econômica. Portanto, o que está acontecendo no Brasil não pode ser desligado das intervenções golpistas como as que aconteceram em Honduras e no Paraguai. Na Argentina, decisões judiciais a serviço dos interesses de corporações internacionais acarretaram prejuízos graves para aquele país. Vemos também a realidade brasileira ligada às tentativas de desestabilizar os governos da Bolívia, Venezuela, Equador e outros do continente.

Expressamos o nosso compromisso com as pessoas vulneráveis: povos indígenas, quilombolas, da floresta, mulheres, jovens negros e da periferia, LGBTTs, idosos, idosas entre outros que poderão ser profundamente impactados com os ajustes econômicos e com a ruptura da ordem democrática e do Estado de Direito.

A democracia é essencial para a convivência e a coexistência entre diferentes religiões, grupos e pessoas não religiosos. Por isso, permaneceremos vigilantes. É com a democracia que aprendemos a ser tolerantes com o outro. No entanto, nossas experiências de fé nos desafiam a irmos para além. Devemos caminhar em direção ao reconhecimento do direito do outro à existência.

Vamos fortalecer o diálogo e anunciar a paz!

24 de março de 2016. Dia Internacional para o Direito à Verdade e 36° ano do martírio de Oscar Romero.